Publicado por: . | 16/12/2012

A mitologia na inteligência

mitologiaGrega

“A estratégia é a ciência do emprego do tempo e do espaço. Sou menos  avaro com o espaço do que com o tempo. O espaço pode ser resgatado. O tempo perdido, jamais”. Napoleão Bonaparte

Sobre mito, os autores divergem em seus conceitos. Alguns acham que mito significa tudo que se opõe à realidade, tendo se originado no obscurantismo da Idade Média.  Para outros, entretanto, o papel do mito é exprimir uma verdade absoluta, contar uma história sagrada servindo de modelo e justificação a todos os atos humanos. Em outras palavras: “mito é um episódio verdadeiro que se passou no início dos tempos e que serve de matriz ao comportamento dos homens”. Parece realmente uma contradição, pois enquanto a linguagem corrente confunde o mito com fábulas, o homem das sociedades tradicionais nele descobre, ao contrário, a única revelação válida da realidade.

Argus surge para presidir toda a atividade de inteligência. Os primórdios de sua história remontam ao Século XVI a.C., reconstituídos em boa parte pelo meticuloso trabalho dos arqueólogos. Para chegar a Argus temos que voltar no tempo até a cidade de Micenas, fundada pelos Aqueus, na parte nordeste da península do Peloponeso. Por volta do Século XII a.C., a hegemonia de Micenas foi suplantada por Argus, cujo nome serviu de escopo para se chamar de Argólida boa parte do Peloponeso. Tal cidade foi fundada por Argus – daí sua denominação -, personagem mitológico da época arcaica grega.

Disposto a expandir a influência de sua metrópole por todo o Mediterrâneo Oriental, conquistando e dominando povos, Argus imaginou, já naqueles tempos, um engenhoso sistema de inteligência destinado a dinamizar a ação de sua poderosa esquadra e de se precaver contra inimigos internos. Criou uma rede de espiões para atuar exclusivamente em atividades domésticas, ou seja, na Argólida; e outra, que precederia sua esquadra nas campanhas contra as cidades que pretendia conquistar.

Argus foi, provavelmente, um dos primeiros governantes a descobrir a importância do sigilo nas comunicações, buscando de várias maneiras proteger suas mensagens das interceptações inimigas. Conta-se que, certa vez, pretendendo enviar um despacho secreto a um príncipe, mandou raspar a cabeça de um de seus mensageiros sobre cujo crânio gravou com um ferro em brasa a mensagem. Crescidos os cabelos, o homem partiu ao encontro do soberano aliado. Sua cabeça foi raspada outra vez e o despacho lido. Depois o monarca mandou que o executassem como forma de manutenção do sigilo.

A história de Argus sobrevive à sua vida terrena, porquanto, após seu falecimento, transforma-se em semideus com acesso direto aos deuses do Olimpo. Há diversas versões sobre sua passagem pela morada dos deuses. Uma delas diz que a deusa Hera, esposa de Zeus, contratou seus serviços para espionar o esposo com fama de mulherengo incorrigível, atraída pelas habilidades de agente secreto que o precederam. Hera descobriu que Zeus andava de namoro com IO, uma semideusa de grande beleza. Nessa incrível história, parece que o erro de Argus foi o de se colocar do lado errado, pois Zeus, descobrindo suas astuciosas investidas, mandou Apolo eliminá-lo.

Segundo outras versões, ao chegar no Olimpo, Argus criou um sistema de espionagem semelhante ao que organizara na Terra, passando a ter conhecimento de tudo o que acontecia ao seu derredor, incomodando a privacidade de vários deuses.

Sobre o nosso personagem mitológico existem registros os mais diversos, como por exemplo: possuía 100 olhos, dos quais 50 dormiam enquanto os outros 50 vigiavam o que acontecia no Olimpo. Outros afirmavam que ele tinha apenas um olho – “olho advisor” – que via tudo e não se cansava nunca. Após a morte do indormido Argus, Zeus, reconhecendo os bons serviços prestados por ele na Terra e no Olimpo, o elevou a “Patrono do Serviço de Inteligência”, transferindo a certos homens eleitos à sua argúcia – o dom de levantar o véu das aparências e a perceber a intenção do inimigo.

Argus foi um personagem que realmente existiu e organizou na Grécia, de forma embrionária, um sistema de inteligência semelhante aos existentes na atualidade. A imaginação popular difundiu histórias fantásticas sobre ele, nascendo o mito. A força desse mito entrou na língua portuguesa, criando uma série de vocábulos ligados diretamente à atividade de inteligência: arguto, argúcia, argumento, argüir, etc. Sua imagem foi finalmente associada ao espião, ao qual nada escapa, e transformada em símbolo do homem de inteligência. Sua legendária esperteza está presente na inteligência e perspicácia de todo agente. Como Argus, o moderno homem de inteligência se distingue dos outros por sua capacidade de ir além do que é possível.

Texto extraído do Livro  História Ilustrada dos Serviços de Inteligência do Professor Raimundo Teixeira de Araújo, que foi meu Professor na ESG/RJ.


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